A 27ª Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas, mais comumente referida como Conferência das Partes da UNFCCC, ou COP 27, foi realizada como a 27ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, de 6 a 18 de novembro, em Sharm el-Sheikh, Egito.

Ao término do evento, após 13 dias de negociações, uma das ações acertadas entre as nações foi a criação de um fundo de “perdas e danos” para ajudar os países pobres que mais sofrem com os desastres causados ​​pelas mudanças climáticas.

Outros assuntos que fizeram parte da pauta foram manter a meta de 1,5ºC ativa como limite para o aquecimento global; redução gradual do uso de combustíveis fósseis, como o carvão; créditos de carbono – as discussões a respeito das regras de comércio de emissões não conseguiram avançar.

Para Renato Cesquini, diretor de Meio Ambiente da ABRAVA e executivo da Chemours, “Para o  setor AVACR,  algumas ações do fórum do Egito podem contribuir para mitigação dos efeitos climáticos, e no caso do Brasil, principalmente se houver financiamento para países em desenvolvimento ”

 

Confira o artigo a respeito da MOP 34 e COP 27 por Thiago Pietrobon, diretor adjunto de Meio Ambiente da ABRAVA

 

MOP 34 e COP 27: Por que os grandes eventos ambientais internacionais entraram de vez nas nossas pautas?

Sábado, 05/11/22, encerrou-se a MOP 34 (Reunião das partes do Protocolo de Montreal para proteção da camada de ozônio) e já na segunda-feira, 07/11/22, foi aberta a COP 27 (Conferência do Clima). E nunca antes, a cobertura destes eventos esteve tão em evidência.

Claro que as consequências das mudanças climáticas estão cada vez mais evidentes, e negá-las seria uma ingenuidade; também é verdade que o atual momento político-econômico do Brasil e do Mundo se reflete na polarização da forma de atuação dos governos (mas não se enganem, as soluções baseadas na ciência devem ser a trilha a ser seguida, sob o risco de distorções, inação e complicações oriundas de teorias infundadas e fake news).

Mas o que estes dois eventos têm em comum e porque você precisa estar atento é a responsabilização? Na reunião do Protocolo de Montreal, a discussão sobre o dumping ecológico, ou seja, a transferência de tecnologia obsoleta para países em desenvolvimento, levou à responsabilização do exportador pelo final do ciclo de vida dos produtos no país de destino.

Nada mais justo, afinal, para os desenvolvidos, descarregar tecnologia obsoleta em outro país significa se livrar de um problema. E por mais que possa trazer benefícios de curto prazo aos que receberão a tal tecnologia obsoleta, ficar com o passivo do outro e ainda ter retardado o desenvolvimento próprio, parece ser passível de responsabilização do exportador. De acordo com a decisão XXXIV/4, as partes deverão comunicar até 1º/05/2023 seus critérios e condições para o recebimento de tecnologias, das quais querem ou não receber. E já considera a inclusão nesta pauta na próxima reunião em 2023.

Já na COP 27, iniciada com a proposta de ser a COP da Implementação, teve o tema Perdas e Danos no centro de sua pauta. Terminando apenas no domingo, 20/11/2022, chegou ao consenso para a formação de um novo fundo para perdas e danos, mas ainda longe de um acordo sobre regras de implementação. A discussão sobre indenizar aqueles que estão sofrendo as consequências das mudanças climáticas, por aqueles que ganharam com a exploração econômica que causou as mudanças do clima, está só no início, mas nos traz muitas certezas.

A litigância climática já acumula decisões na Justiça, condenando países e empresas pela inação ou não cumprimento de metas, acordos e compromissos. Um levantamento da London School of Economics and Political Science apontou mais de 2.000 casos em andamento[1]. Assim, não há como falar em futuro, sem aceitar que a responsabilidade e o papel das empresas e dos governos nas ações relacionadas com o meio ambiente ganharão uma nova dimensão. Compromissos e ações passam, desde já, a ser esperados e demandados, não apenas de governos, mas também de empresas. E conciliar metas de resultados anuais com a responsabilização de efeitos sobre o meio ambiente, nem sempre imediatos, é um desafio enorme para os gestores e conselhos. Por isso, os eventos ambientais ganharam a relevância atual nas agendas de todos nós.

Estamos aprendendo, sem muita chance para erro. Estamos presenciando o setor privado na vanguarda do debate (e da ação), que antes limitava-se aos agentes públicos. Estamos sentindo a sociedade demandando mudança de forma mais intensa, entendendo as soluções baseadas em ciência antes que os gestores e o poder público, acirrando acusações. É desafiador trilhar novos caminhos, mas é preciso que você se pergunte o que estamos fazendo neste momento a respeito da agenda climática e do ESG para não ficar para trás nesta jornada sem volta.

Outras decisões dos eventos internacionais relevantes para o setor

A MOP 34 manteve fortemente o foco em soluções baseadas em eficiência energética e soluções de baixo GWP. Trouxe decisões para o fortalecimento do combate ao comércio ilegal de SDOs e demais substâncias controladas pelo Protocolo de Montreal, bem como o fortalecimento do monitoramento atmosférico destes produtos. Manteve o acompanhamento das normas de segurança na aplicação de soluções e abriu uma discussão bastante delicada, que visa definir os impactos da pandemia de Covid-19 na definição da linha de base das partes do Artigo-5 (os países em desenvolvimento cuja linha de base de HFCs para implementação da Emenda de Kigali).

A COP 27 avançou historicamente na criação do novo fundo para perdas e danos, sendo bem específico ao mencionar países ameaçados pela subida do nível do mar, migrações em massa forçadas por desastres naturais e efeitos diretos das mudanças climáticas.

Mas o grande debate por trás da decisão é se o financiamento virá apenas dos países desenvolvidos ou de todos os atuais grandes contribuintes das emissões de GEE. Sendo bem específico – China, Índia e Brasil devem contribuir com o fundo ou ser beneficiários? As decisões da COP 27 mantiveram a meta de 1,5ºC e avançaram no fortalecimento de soluções baseadas na ciência e manutenção das florestas, mas adotaram linguagens menos específicas e não aprovaram as propostas de incluir claramente a redução de combustíveis fósseis.

Do restante, a neutralidade das ações prevaleceu (apesar de, nos discursos, o alarmismo ter dado o tom). Enquanto, nas palavras do secretário-geral da ONU, António Guterres, estamos avançando para “tolerância zero para o greenwashing no net-zero”, por meio de uma nova força-tarefa para regulamentação dos compromissos corporativos líquidos zero em todo mundo; por outro, o reconhecimento de manter o objetivo do 1,5°C significa reduzir as emissões em 43% até 2030 em relação aos números de 2019, mas, na prática, os compromissos atuais de descarbonização representariam o corte de apenas 0,3% na comparação 2030-2019.

A transição para energias renováveis, como uma forma de resolver a atual crise energética, é clara (e até alcançou bens resultados nesta COP), mas o medo da transição e o lobby ainda freiam avanço semelhante do lado dos combustíveis fósseis, o que deixa o acordo na mesma página de um ano atrás (decisões da COP 26). E me arrisco a dizer que não será na COP 28, na Arábia Saudita, que teremos o avanço necessário.

Por fim, o avanço sobre o Artigo 6 do Acordo de Paris, que definirá as regras do mercado de carbono, não foi conclusivo, mais uma vez. O entrave parece estar no ceticismo crescente em torno das compensações de carbono de má qualidade e a necessidade de uma regulamentação mais rigorosa, para que, de fato, este instrumento traga os resultados climáticos e não apenas um “bom negócio”, seja para qual lado for.

Nos corredores da COP 27, o Grupo de Especialistas de Alto Nível das Nações Unidas sobre o Zero Líquido criou um limite para o “mau uso de compensações de carbono”, aumentando a pressão para acertar isso em 2023. Mas será preciso avançar na definição do que é um “bom uso dos créditos”, o que é uma “boa remoção”, avançar no debate sobre o papel das emissões evitadas neste mercado, criar os mecanismos para que a “dupla contagem” não seja um problema e acertar os critérios de compliance e confidencialidade.

[1] https://www.lse.ac.uk/granthaminstitute/publication/global-trends-in-climate-change-litigation-2022/