Se os projetistas de climatização sempre respeitaram em suas especificações as normas e regulamentações que regem a qualidade do ar de interiores, o mesmo não pode ser generalizado para as atividades ligadas à operação e manutenção de sistemas. De fato, os profissionais conscientes das responsabilidades atreladas às suas atividades frequentemente encontram situações que, longe de garantir a saúde dos ocupantes de ambientes climatizados, são verdadeiras bombas de efeito retardado. Não raro é o PMOC para constar, manutenções que se resumem a um passar de pano na carcaça dos equipamentos e alterações na operação de sistemas que comprometem seriamente a renovação do ar ambiente.
A crueldade do novo coronavírus, ao que parece, está modificando a percepção dos contratantes de serviços da AVAC-R. “Sem dúvida os proprietários e responsáveis dos empreendimentos enxergam com mais preocupação a qualidade do ar dentro de suas empresas. É nítido o aumento da necessidade em melhorar os sistemas para que eles atuem como auxiliares no combate à pandemia da covid-19. Hoje o usuário quer saber se o ar que respira nos ambientes que frequenta está em boas condições. Por isso manter os laudos de qualidade do ar interno em dia é uma fotografia dessa situação”, diz Leonardo Cozac, CEO da Conforlab e diretor de operações e finanças da Abrava.
Arnaldo Lopes Parra, diretor da Pósitron e, também, diretor de relações associativas e institucionais da Abrava, concorda com a percepção. “Tenho percebido uma certa movimentação de proprietários e gestores de empresas para criar e manter locais cada vez mais saudáveis, seguros e confortáveis para os funcionários, clientes e demais usuários. Existe forte responsabilidade destes gestores para assegurar ambientes livres de contaminantes, em especial o Sars-CoV-2. Especialistas da nossa área têm emitido alertas para a correta observação de todos os parâmetros de qualidade do ar de interiores, sendo a temperatura e umidade adequadas, bem como os níveis de pureza e renovação de ar, com o objetivo de se atender leis e normas e, assim, evitar a propagação de doenças transmissíveis pelo ar.”
De imediato, a realidade exposta pelo Sars-CoV-2 impõe a necessidade de reduzir ao máximo a sua transmissão, como explica Rodrigo L.S. Pellegrini, engenheiro de projetos e obras da RLP Engenharia. “Atualmente a prioridade é a mitigação da transmissão do Sars-CoV-2, sendo assim, deve-se procurar implementar estratégias que aumentem a ventilação nos espaços condicionados, aumentem o nível de filtragem do sistema e, caso necessário, também a implementação de estratégias utilizando dispositivos de limpeza do ar. A partir dessa realidade, o responsável pela operação do edifício deve atentar para as taxas de ventilação dos ambientes, horários de operação, recirculação e manutenção. Cada espaço e operação de um edifício é único e requer uma avaliação específica, porém, existem estratégias que podem ser adotadas, como, quando houver a troca de pessoas entre espaços ocupados, efetuar a renovação total do ar do espaço, iniciar o sistema de ventilação (e exaustores de banheiro) por um certo período antes e depois da operação regular do edifício e procurar aumentar o volume de ar externo o máximo possível.”
Como tem sido atestado por todas as instituições com credibilidade, a atenção com a ventilação eficiente dentro do ambiente climatizado é primordial. “Sistemas de climatização para conforto térmico demandam uma taxa de renovação de ar mínima, e essa condição deve ser respeitada nessa pandemia por um patógeno transmitido pelo ar. Ligar a renovação do ar 2 horas antes do início da operação e deligar 2 horas depois ajuda também. Manter os filtros de ar, bem como todo o sistema de climatização, é necessário para redução de partículas que possam carregar o vírus pelo ar”, alerta Cozac.
Boas práticas de manutenção para sistemas de ar-condicionado
É neste sentido que práticas antes toleradas por gestores e proprietários de edificações climatizadas tendem a ser reduzidas ou eliminadas. “Quando falamos em qualidade do ar que respiramos em ambientes internos, estamos nos referindo diretamente também à qualidade da manutenção aplicada aos sistemas de climatização. Não há como assegurar uma boa qualidade sem os serviços de manutenção adequados. Chamamos de boas práticas de manutenção para sistemas de ar-condicionado, o conjunto de atividades que estejam de acordo com as normas e leis que regem o setor. Também sabemos que uma das formas de contágio da covid-19 é pelo ar que respiramos. Assim, é fácil entender a grande importância da correta operação e manutenção de sistemas de ar-condicionado para proporcionar ambientes seguros, evitando que contaminações se concentrem em ambientes climatizados”, enfatiza Parra.
O diretor da Pósitron, diz, ainda, que o papel do correto tratamento do ar neste cenário é evitar concentrações de poluentes que possam causar moléstias transmitidas pelo ar, dentre elas a covid-19. “A observação das boas condições de limpeza dos principais componentes do equipamento irá, com certeza, contribuir para evitar acúmulos de pós, gerando ambientes mais limpos e seguros. A filtragem adequada do ar de recirculação e renovação são, também, fundamentais para reduzir a quantidade de aerodispersóides.”
Assim, no cenário aberto pela pandemia, insiste Parra, ganha maior relevância, pela facilidade de adequação, o PMOC – Plano de Manutenção, Operação e Controle dos sistemas de climatização. “A visão dos especialistas deve ser mais exigente quanto às atividades de limpeza, em especial atenção aos componentes que podem ser considerados disseminadores de poluentes, tais como bandejas, filtros de ar, serpentinas e ventiladores. Ênfase nas higienizações com maior frequência, uso constante de produtos químicos com eficácia comprovada contra cargas virais e demais microorganismos, e instalação de novas tecnologias com ação também comprovada contra cargas virais, tais como dispositivos ultravioleta e de radiação catalítica. Estes produtos de tecnologia mais avançada estão disponíveis no Brasil, e são acessíveis na relação custo x benefício. Assim, a correta aplicação deste conjunto de produtos e serviços irá trazer maior confiabilidade, segurança e bem-estar aos ocupantes destes ambientes climatizados.”
Sobe-desce das soluções e tecnologias
“Com a demanda por novas soluções por tratamento de ar, estão surgindo diferentes tipos de tecnologia, particularmente do tipo ionizante (entre outros nomes), com o objetivo de limpar o ar, porém, deve-se ficar atento pois muitos destes equipamentos ainda não tem sua eficácia comprovada e não se conhecem todos os efeitos colaterais que podem causar ao corpo humano, então, é recomendado apenas adquirir produtos certificadamente eficazes e seguros na limpeza do ar e combate à transmissão do vírus. As tecnologias tradicionais de filtragem (MERV13+) e aumento da ventilação ainda são as mais recomendadas”, defende Pellegrini, da RLP.
Cozac enfatiza a crescente importância de tecnologias de purificação de ar. “Aumentaram as ofertas por equipamentos portáteis com filtros HEPA, sistemas com fotocatálise, lâmpadas UV-C. Com isso, há redução de custos dessas tecnologias, bem como melhor compreensão do mercado de suas características e funcionalidades. Muita atenção, pois cada uma tem uma aplicação distinta da outra, sendo necessário analisar bem onde e como cada uma pode e deve ser utilizada. Devem ser produtos certificados conforme sua aplicação.”
Por outro lado, tecnologias obsoletas serão cada vez mais descartáveis. “Adotar as novas estratégias para controle da qualidade do ar exige que os equipamentos de AVAC trabalhem com uma maior carga, por mais horas e consumindo mais energia elétrica para manter o aumento na demanda de ar limpo. Com isso, equipamentos mais antigos que não possuem boa eficiência energética perdem seu atrativo por deixarem de ser a opção mais econômica”, entende Pellegrini.
“Produtos e dispositivos que não atendam às exigências da QAI, por exemplo, acabam não atendendo as expectativas. Perdem relevância, neste sentido, os produtos não-biodegradáveis, filtros de menor eficiência e equipamentos que dificultem ou não permitam a correta renovação de ar. As tecnologias novas podem influenciar diretamente a diminuição ou eliminação de doenças transmissíveis pelo ar”, sentencia Parra.
Para Leonardo Cozac, profissionais que não se especializarem no tema de qualidade do ar interno, tendem a perder mercado. “O usuário agora quer, além do conforto térmico, soluções que tragam melhor qualidade do ar interno. Por exemplo, acredito que a venda de aparelhos splits para ambientes de uso não residencial, sem uma renovação de ar adequada, que diga-se de passagem é crime, deverá diminuir. Os profissionais terão que estar capacitados a oferecer conforto térmico mais saúde aos usuários. Ganha o mercado de ar-condicionado e ganha o usuário.”
Da redação Revista ABRAVA Climatização & Refrigeração AQUI