aumento do número de casos de legionelose – uma pneumonia potencialmente fatal causada, principalmente, pela Legionella pneumophila – tem preocupado especialistas e autoridades da área de saúde pública em muitos países.

No fim de abril, uma inspeção de rotina realizada nos sistemas hidráulicos de uma escola secundária na cidade de Paredes, em Portugal, detectou uma estipe dessa bactéria no estabelecimento, o que levou ao fechamento temporário das piscinas e do pavilhão das aulas de educação física.

Segundo dados de um relatório do Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças, o país registrou, em 2017, 232 casos de legionelose, enquanto Espanha, França e Itália registraram, respectivamente, 1.363, 1.630 e 2.013 casos naquele ano.

Enfim, nunca tantos casos da doença dos legionários foram registrados como nos últimos anos, tanto em Portugal como no restante da Europa.

Nos EUA, as autoridades da área de saúde estimam que ocorram de oito a 18 mil casos de legionelose por ano, dos quais mais de 10% são fatais.

Presente em torres de resfriamento, fontes decorativas, balneários, spas, lava-rápidos e até em consultórios dentários, a Legionella é responsável por matar em torno de cinco mil brasileiros todos os anos, segundo dados extraoficiais.

De acordo com especialistas, o grupo mais vulnerável às doenças causadas por esse micro-organismo é formado por crianças, idosos e pessoas com o sistema imunológico enfraquecido.

Na avaliação da pesquisadora Patricia Graef, diretora da Associação Americana de Engenheiros de Aquecimento, Refrigeração e Ar Condicionado (Ashrae), os surtos recentes da doença dos legionários têm aumentado a conscientização sobre ela, suas causas e estratégias de prevenção.

Durante o 8º Seminário Internacional da Qualidade do Ar de Interiores, encontro promovido em São Paulo pela Associação Brasileira de Refrigeração, Ar Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava) e o capítulo brasileiro da Ashrae, a especialista lembrou que, por ser uma doença para a qual não existe vacina, sua prevenção depende da manutenção adequada dos sistemas hidráulicos dos edifícios.

Patricia Graef | Foto: Nando Costa/Pauta Fotográfica
Prevenção da legionelose depende da manutenção adequada dos sistemas de abastecimento de água dos edifícios, diz Patricia Graef | Foto: Nando Costa/Pauta Fotográfica

As partes das tubulações em que o fluxo de água potável fica estagnado são uma das áreas de proliferação do patógeno, pois os fluidos de limpeza não circulam nesses trechos conhecidos como “dead legs”, disse.

Quando o biofilme, uma substância pegajosa criada por bactérias, se forma na parede interna das tubulações, ele protege a Legionella do calor e do desinfetante. E a água morna, geralmente na faixa de 35 ºC e 46 ºC, propicia a formação de colônias.

Uma vez que cresce, a Legionella pode ser potencialmente espalhada por qualquer componente do sistema de encanamento que gere um aerossol ou uma fina névoa de água.

A bactéria entra nos pulmões quando é inspirada através de gotículas de água no ar. Na maioria dos casos, isso ocorre na forma de vapor, spray ou névoa lançados no ar por chuveiros, torneiras, sistemas de ar condicionado, banheiras de hidromassagem ou ambientes similares.

Embora sejam bastante comuns em ambientes aquáticos, as bactérias do gênero não são abundantes, o que significa que raramente formam grandes colônias.

“Os riscos de surtos de legionelose podem ser minimizados por meio da aplicação da norma Ashrae 188 – Legionelose: Gerenciamento de Risco para Sistemas de Água Prediais”, salientou Graef.

O regulamento técnico aplica-se a edifícios comerciais, institucionais, plantas industriais ocupadas por seres humanos e unidades residenciais múltiplas abastecidas por um único sistema de água.

“A Ashrae 188 destina-se aos proprietários e gerentes dessas instalações e também para aqueles envolvidos em seu projeto, construção, instalação, comissionamento, operação e manutenção de sistemas de água prediais e dispositivos específicos”, explicou.

Após a palestra proferida no Senai Oscar Rodrigues Alves, a especialista norte-americana conversou com o Blog do Frio sobre o assunto. A seguir, trechos da entrevista:

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Como conscientizar as pessoas sobre os riscos inerentes à Legionella?

Esse é o meu propósito. Já viajei pelo mundo todo ministrando essa palestra. Nós queremos que as pessoas estejam cientes de que o problema não está apenas na torre de resfriamento, mas pode estar em todos os lugares do prédio: nas torneiras, nos chuveiros, na banheira do spa ou nas fontes decorativas. É uma bactéria muito comum e o fato é que as pessoas não sabem onde encontrá-la.

Por que existe uma baixa percepção de risco em relação à legionelose?

Em primeiro lugar, eu acho que é porque muitas pessoas têm essa ideia de que “não vai ocorrer comigo”. A outra coisa é que elas estão procurando [a bactéria]na torre de resfriamento. A torre de resfriamento recebe toda a atenção e publicidade porque, geralmente, é associada com os surtos; portanto, ela acaba recebendo mais atenção. Consequentemente, as pessoas acham que estarão seguras, se ficarem longe da torre de resfriamento.

A torre de resfriamento, portanto, não é a principal fonte de Legionella?

Não, apenas 22% das torres de resfriamento têm Legionella. A principal fonte é a água potável no prédio. É a água para uso humano. Neste caso, seria a água de temperatura mais elevada. A água quente é um dos grandes problemas.

Qual é o papel dos engenheiros da área de climatização (HVAC) na prevenção de surtos de Legionella? E o que eles precisam saber para cumprir essa missão?

Os engenheiros têm certas obrigações em relação ao encanamento. Eles são responsáveis pela manutenção, e devem não apenas cuidar dos sistemas hidráulicos, mas também dos pontos de acesso para efetuar os reparos. Estamos falando de locais em que se pode tirar amostras ou adicionar desinfetantes biocidas, e a mesma coisa ocorre em relação às torres de resfriamento. Os engenheiros devem passar instruções sobre como construir torres de resfriamentos mais seguras.

Como os empreiteiros do setor e seus clientes podem agir de forma preventiva?

Antes de tudo, é preciso construir mais sistemas de encanamento, além de saber as áreas onde a água simplesmente para de fluir. Esses “dead legs” deixam a água pútrida. Se uma porção do prédio não está ocupada por alguma razão qualquer, quando for ocupada novamente, todos os sistemas deverão ser higienizados. É necessário encontrar uma maneira de fazer a água fluir através dos canos.

No que tange ao combate à Legionella, que conselho você daria para os engenheiros brasileiros?

Meu principal conselho é: conheça a nossa Diretriz 12, cujo objetivo é fornecer informações e orientações sobre segurança em sistemas de água. Leia o texto de cabo a rabo. Ela também fornece orientações para implementação da Ashrae 188, norma que especifica como você deve higienizar as tubulações e criar um plano de gestão de riscos. Enfim, essa diretriz explica tudo o que precisa ser feito pelos profissionais do setor.

 

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