Foi na semana passada,  conversando sobre essa temperatura de fogueira do nosso verão com o clínico geral e infectologista Paulo Olzon, professor da Universidade Federal de São Paulo, que ele me lembrou: o calor humano existe, minha gente. E como existe! Claro, essa é minha livre tradução. O médico se referiu ao manto térmico, uma camada de ar em torno de todo o nosso corpo que é  quente, quente, quente..

Afinal, dissipamos calor cada vez que nossas células usam energia. Ou seja, sempre. Enquanto estivermos vivinhos da silva seremos criaturas mornas, aquecendo o ambiente, sem um instante de refresco. Daí porque um bom ventilador ajuda e se abanar, idem. É uma estratégia para desfazer esse manto de ar aquecido ao nosso redor.

A gente sabe bem do que se trata. Sente isso na pele. Em dias frios, se um vento sopra, tremelicamos. Ora, a lufada manda para longe esse cobertor invisível. Aliás, um dos motivos de se cobrir nos saudosos dias gélidos— de roupa, manta, cachecol  — é justamente segurar esse manto natural. Ficar juntinho? Puxar um pouco o manto do outro.

Na situação oposta — aquela que nos faz assar nas ruas por esses dias — , se as folhas das árvores nem se mexem, se não sopra nem sequer uma leve brisa,  você tem a convicção de que o inferno é aqui e agora. E aguente o manto térmico, porque ele é todo seu! Ou trate de ventilar o ambiente, o que acho uma opção muito mais agradável.

Por falar nisso, foi agradabilíssima a minha entrevista com o engenheiro mecânico Oswaldo de Siqueira Bueno, considerado a maior sumidade em climatização do país. Professor da FEI, em São Paulo, coordenador do CB-55 — o comitê brasileiro que trata justamente da qualidade do ar na ABNT — e consultor da ABRAVA – Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento, ele teve a paciência de dar uma verdadeira aula ao blog. Nela, ficou evidente ventilação é muito mais do que desfazer o manto térmico.

Ventilar costuma garantir a qualidade do ar ao ajudar a renová-lo. Lembre-se simplesmente do básico: respiramos. Portanto, lançamos baforadas de gás carbônico. E ele, ensina o velho professor, é um “xis” importante na questão: “Quando o ar não é renovado, o problema não é faltar oxigênio como muitas pessoas imaginam — em geral, ele dá e sobra. O ruim é o gás carbônico acumulado”,  ouvi.

Um ventilador, no caso, movimentando a atmosfera do ambiente graças à velocidade de suas hélices, puxa literalmente um pouco do ar de fora com menos gás carbônico. Claro, não vale ligar o aparelho sem manter uma janela ou outra passagem de ar aberta.

Outro fator que essa renovação do evita: o mau cheiro. Pois quando expiramos, lançamos não só o tal do gás carbônico no ar, mas uma série de substâncias voláteis liberadas pelas reações que ocorrem em nosso corpo. Sem contar tudo aquilo que exalamos da cabeça aos pés.  Nas ruas, respirando ao ar livre, existem cerca de 400 partículas dessas substâncias voláteis da expiração por milhão de partículas de gás carbônico. Dentro de casa, do escritório ou de qualquer outro canto, porém, elas sempre se concentrarão. O ideal é que não ousem superar 1 mil partículas por 1 milhão. Se essa proporção aumenta para umas 3,5 mil partículas odoríferas para cada milhão de moléculas de gás carbônico passamos a não nos suportar.

A boa ventilação também contribui para controlar  a umidade — de novo, por puxar um pouco do ar de fora para dentro. Umidade demais piora à beça a sensação do calor e, lembre-se, também lançamos vapor de água em cada expiração.

A propósito, voltando à vaca fria —  já que estamos com inveja da vaca —, é a umidade e a camada de ar de uns 38 graus em torno do nosso corpo que mais nos interessa, nestes tempos escaldantes, resolver. Se isso não acontece, surge aquela sensação de que o lugar está abafado. Hora de ligar o ventilador.

Não compensa tanto virá-lo para você, se ele não trouxer o ar de fora. Portanto, o melhor é colocá-lo bem na altura de uma janela aberta, voltado para dentro. Os modelos com pés altos facilitam esse posicionamento, mas você pode colocar aqueles modelos menores em um móvel ou sobre outro tipo de apoio que o eleve o suficiente.

Deixar o ventilador no chão do quarto? Adianta muito pouco. E, se o cômodo não estiver em dia com a vassoura, ainda levantará de vez a poeira do chão. Os modelos de teto?  Ajudam apenas na medida em que movimentam o ar de dentro, mas não trazem aquele que está lá fora. Em outras palavras, não renovam a atmosfera ambiente.

Outra dica preciosa: para refrescar uma casa, vale aproveitar os horários mais frescos da jornada de 24 horas para ventilar todos os cômodos. Quando é isso? Ora, de madrugada. Portanto, se possível, deixe as janelas abertas durante a noite— mas, atenção, desde que sejam altas, tenham grades ou até mesmo telas, conforme a região, para evitar a entrada de insetos.

Em condições de segurança, você até mesmo ligar um ventilador não apenas no seu quarto de dormir, mas naquela sala vazia. Assim, ela amanhecerá mais fresquinha. Fiquei sabendo pelo engenheiro Bueno que essa é uma estratégia muito usada em shopping centers, quando estão fechados, para refrescar seus corredores e economizar o ar-condicionado. Aproveitei o gancho e soltei a pergunta: o que ele preferia, ar-condicionado ou ventilador? A resposta sincera foi um “depende”.

A justificativa se baseou na adaptação do corpo humano à temperatura externa. “O organismo sofre se sair do ar quente e entrar em um ônibus com o ar-condicionado a mil para descer em uma estação qualquer dali a meia hora e cair de volta no calorão”, me disse. “No entanto, se você viajar de ônibus por seis horas, a história será outra.” Ou seja, o entra e sai de um ambiente com ar-condicionado não ajuda à saúde. Sem contar que ele retira bastante umidade e existem pessoas mais sensíveis ao ar muito seco.

Há casos, porém, que os motivos para abrir mão do ar-condicionado são outros: falta dinheiro, faltam condições elétricas para instalar o sistema de condicionamento… Aí, apele para o ventilador e esfrie a cabeça pensando nas vantagens de renovar o ar que você respira.

Só busque informações sobre um modelo silencioso. Não adianta testá-lo nas lojas, que costumam ser ruidosas, o que disfarça o som do ventilador ligado.  Dormir bem já não é moda no verão 2019. Pense se, além de a impressão de que a natureza jogou dez cobertas de lã sobre você, houver barulho! Afe, ninguém merece.

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